A legitimidade do sofrimento
Por Jane Maiolo
E a tua vida mais clara se levantará do que o meio dia; ainda que haja trevas, será como a manhã.[1]
“Coragem, meu filho! O Senhor não desampara!” , afirmava o Benfeitor Clarêncio ao espírito André Luiz , na ocasião do resgate nas regiões de penumbra do mundo espiritual, conforme a narrativa contida no livro “Nosso Lar”. [2].
O alento chegava com a vibração do consolo e da humildade daquela alma generosa que se prontificava a socorrer aqueles irmãos infelizes presos ao remorso, sofrimento e dor.
É fato que todos nós, seres humanos em processo evolutivo , desejaríamos ouvir palavras nunca dantes ouvidas, sentenças que de alguma forma nos acalentassem, nos esclarecessem, nos confortassem e até mesmo nos livrassem da aflição instantaneamente.
Vez por outra nos questionamos sobre de onde viriam tais alentos, ou quando encontraríamos soluções para nossas aflições e esclarecimentos para as nossas mais intensas amarguras?
Esquecemos, por vezes, que somos transeuntes e que a hospedagem no corpo físico é breve e ligeira para alguns e penosa, sombria e acerba para outros.
Entender os mecanismos da vida é tarefa laboriosa que não se conclui em uma única reencarnação. Estamos indo e vindo nesta complexa busca pelo entendimento, sabedoria e elevação da nossa condição de espíritos eternos, filhos de Deus , criados para a plenitude.
Sem sombra de dúvidas os ensinamentos do Cristo são de uma singularidade inigualável. Por mais que os homens tentaram mutilar, adulterar, minimizar a dimensão dos seus princípios e tudo o que restou, enquanto material de reflexões em torno da transcendência, serve de roteiro divino para a nossa conquista e domínio das nossas conturbadas, aflitivas e destemperadas emoções.
Somos multidões de sofredores, abatidos pelo látego da dor e causticantes angústias. Muitos indignados e insurgentes não suportando viver no clima de luta e superação sucumbem ao peso dos desgostos e atentam contra a própria vida física.
Segundo informações da OMS estima-se que 800 mil pessoas suicidam-se anualmente em todo o planeta, ou seja uma pessoa a cada 40 segundos. Essa é a segunda maior causa de morte em pessoas entre 15 e 29 anos, enquanto que os idosos com mais de 70 anos são aqueles que mais frequentemente se tornam suicidas. [3]
A legitimidade do sofrimento é inegável em nosso carreiro evolutivo. Sofremos por fragilidade moral, desinteligência e várias vezes por deseducação religiosa. Não se pode mensurar uma dor, entretanto é preciso ajuizar na dimensão da tormenta que nos alcança.
O mal , que também é transitório, resulta do desvio de comportamento humano, o mal não tem raízes, não é da criação divina, inevitavelmente será erradicado e eliminado do comportamento do espírito depurado. O que a Lei divina prevê é um conjunto de medidas corretivas toda vez que ocorrer qualquer desvio. [4]
Somos seres fadados a plenitude e um dia poderemos afirmar tal qual o fez Jesus “Eu e o Pai somos um”, ficando a criatura humana encarregada de seu avanço ou retardo na marcha evolutiva, consoante preceitua O Livro dos Espíritos , questão 117, quando Kardec indagou aos Benfeitores: Depende dos Espíritos o progredirem mais ou menos rapidamente para a perfeição? Os Baluartes do além responderam que “Os Espíritos a alcançam mais ou menos rápido, conforme o desejo que têm de alcançá-la e a submissão que testemunham à vontade de Deus. Uma criança dócil não se instrui mais depressa do que outra recalcitrante?”
O amor de Deus é suficientemente grande, majestoso, incomensurável para nos dar outras oportunidades de recomeço , eis a lógica da reencarnação e a possibilidade de sermos perfeitos.
O número de suicídio no mundo aumentou consideravelmente , fato que nos leva a refletir por que tanta desistência da vida? Tanta desesperança? Tanta fragilidade?
Respiramos na mesma atmosfera psíquica , os pensamentos negativos nos intoxicam, nos deprimem, nos contaminam, mas onde está nossa vigilância ? Esquecemos por vezes que é preciso ter coragem para combater o bom combate?
As lamentações agravam nossas perturbações, ampliam nossos desequilíbrios emocionais e intensificam nossas enfermidades. Não olvidemos que o Senhor não nos desampara!
Dor e sofrimento ainda são componentes no nosso processo evolutivo. A dor , enquanto sofrimento moral, é a resposta da Lei divina aos que se atritaram com seus postulados reguladores do universo ético.[5]
Portanto, o sofrimento é o espelho de uma Lei incorruptível, produto oriundo do princípio de causa e efeito. A Lei jamais exige a reparação daquele que não errou nos caminhos múltiplos das existências. Entretanto, o clima de desespero, defecção, de abandono de nossas causas devem ser reprimidos.
Elevar o padrão mental continua sendo o remédio salutar ao alcance de todos. Nunca olvidemos que todo bem procede de Deus, mas cabe a cada um de nós buscarmos o lenitivo para os nossos sofrimentos através da prece, da ação prestativa no campo da caridade e do burilamento dos nossos sagrados sentimentos.
Somos de Deus e o Cristo nos adverte: “Brilhe a vossa luz”!
Coragem, meu filho!- assevera irmão Clarencio e acrescenta – O Senhor não desampara!
Saibamos sofrer as intempéries com dignidade pois “ é possível estejas vendo tudo em derredor de teus passos pelo prisma do desespero…Entretanto, asserena-te e aguarda, confiante, porque,se a Misericórdia de Deus ainda não está alcançando o teu quadro de luta, permanece a caminho.”[6]
E a tua vida mais clara se levantará do que o meio dia; ainda que haja trevas, será como a manhã. E terás confiança, porque haverá esperança; olharás em volta e repousarás seguro.
Aguardemos, confiando.
Jane Maiolo
Referências bibliográficas:
[1] Bíblia de Jerusalém- livro de Jó –cap. 11:17
[2] XAVIER, Francisco Cândido. Nosso Lar , ditado pelo espírito André Luiz , cap.1- Brasília /DF: Ed FEB, 2007
[3]Disponível em http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2014/09/140904_suicidios_bra…, acesso em 11/11/2015
[4]Miranda, Hermínio C. O evangelho de Tomé- Parte II cap3. Pag 206. Rio de Janeiro: Arte e Cultura-1991.
[5] KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos, questão 117- Rio de Janeiro: Ed FEB, 2007
[6]idem 4
[7] Xavier, Francisco Candido. Palavras de vida externa , ditado pelo espírito Emmanuel ,cap.80, 17ª Edição , Uberaba/MG: Ed. CEC -1992