A Reencarnação
Extraído da obra
Léon Marie Martial Chevreuil – O Espiritismo na Igreja
X
A reencarnação
A hipótese das reencarnações não é somente a mais compreensível e a mais racional das que foram postas em avanço para explicar o destino humano, ela é ainda a única que não nos conduz a conclusões absurdas ou ímpias.
Do ponto de vista científico, ela está de acordo com a marcha de nossas evoluções; do ponto de vista religioso, ela permite ao pensamento de se desgarrar dos erros antigos que nos obrigavam a crer na infinita crueldade de Deus.
Com as vidas sucessivas não há desigualdades no destino dos seres. Essa afirmação fará admirar-se talvez os que entendem que se retêm somente na vida terrestre, entre o curto espaço de tempo compreendido entre o berço e o túmulo, mas, para aquele que segue o traço do primeiro átomo vivo desde a saída do limo terrestre e que vê lançar-se, como nosso sistema planetário, através de um desconhecido que se adentra no infinito para aquele, todos os seres têm o mesmo destino, as desigualdades aparentes não são senão acidentes circunstanciais de uma longa travessia que, tomada no seu conjunto, será a mesma para todos.
A vida é uma experiência que nos é permitida recomeçar até que tenhamos achado o caminho da felicidade. Essa doutrina é muito antiga, ela aparece nos ensinos de Pitágoras, de Platão, de Sócrates; nas revelações de Jesus e na crença dos primeiros cristãos. Mas, pelo Espiritismo moderno ela se torna cientificamente confirmada e, em nossos dias, ela já reviu a adesão dos mais eminentes espíritos do mundo filosófico e religioso.
Encontram-se indícios da tese reencarnacionista nos textos da Gênese, no livro de Jó, do profeta Isaías; a vocação dos patriarcas e dos profetas se explica pela pré-existência; essa idéia aparece constantemente na Bíblia; a hipótese da reencarnação de Elias na pessoa de João Batista é uma das que reapareceram nos quatro Evangelhos. Ou, com exceção das narrativas da Paixão, não há muitos episódios que se encontram nesse caso:
Certos doutores criam que Jesus era uma reencarnação de Elias ou de Jeremias (Mateus, XVI, v.14; Marcos, VIII, v. 28; Lucas, IX, v. 19). Essa reencarnação de Elias era tão esperada pelos Judeus que ela é objeto constante de suas preocupações. Eles enviam mensageiros para questionar João Batista (João, I, v. 21). E todas as vezes que, no evangelho, ele fez alusão às reencarnações, Jesus não faz jamais nada para refutar essa hipótese, ele adere implicitamente. É por seus pecados, pergunta-se-lhe, que este homem nasceu cego? Para nascer com pecados é preciso ter vivido antes. Quando Judas veio ao mundo, uma maldição pesava sobre ele desde antes de seu nascimento.
Jesus não podia refutar uma doutrina que ele mesmo ensinava em segredo (João, III, v. 7). E, se é possível racionar sobre o sentido da conversação com Nicodemos, toda ambigüidade desaparece no versículo 12, onde Jesus diz: “Eu venho para vos falar de uma coisa terrestre quando eu dizia que é preciso que vós nascêsseis de novo, e vós ignorais isso! Que será então quando eu vos falar das coisas celestes!”
Mas o reconhecimento formal das reencarnações se acha a propósito de João Batista (Mateus, XI, v. 14): “E se vós quiserdes receber o que vos digo, é o Elias que devia vir.” Essa palavra é formal e torna impossível toda contestação; a afirmação é repetida no capítulo XVII, v. 12 e 13: “Eu vos digo que Elias já veio…” E então os discípulos compreenderam que era de João que ele lhes tinha falado.
Ora, esse é o comentário do texto sagrado. Não é mais uma colocação irrefletida que se poderia, a rigor, atribuir a alguma imprudência do narrador; não, é, aqui, a revelação mesmo, é o texto sagrado que o versículo 13 sublinha e interpreta. Sabe-se lá com que cuidado meticuloso se expurgou, nos evangelhos, tudo o que podia provir de fonte apócrifa. É preciso admitirmos a explicação; pois, se esse texto fosse recusável, nenhuma palavra do Evangelho teria mais autoridade.
Vemos, aliás, na Bíblia, que essa reencarnação de Elias é a prova exigida por todos para crer na missão daquele que deve vir. É preciso observar também a palavra do profeta Zacarias antes do nascimento de João Batista: “Ele viverá no espírito de Elias”; o que se poderia interpretar: É o espírito de Elias que se manifestará em João Batista.
Não se compreende por isso, que um católico possa conservar dúvidas sobre essa antiga tradição, que subsiste aliás entre os pais da primitiva Igreja, pelo menos no estado de hipótese admissível.
Mas essa doutrina tira sua principal força da solução satisfatória que ela traz a uma multidão de dificuldades de ordem filosófica e religiosa que, sem ela, seria impossível resolver.
A harmonia que nós devemos necessariamente atribuir às obras da criação divina não permite supor outra coisa senão uma lenta evolução das almas emanadas de Deus; sua obra seria verdadeiramente incoerente se ele criasse instantaneamente idiotas e crianças nascidas mortas.
Não há senão a preexistência e a germinação tardia que possam explicar as inferioridades intelectuais ou morais, assim como a desigualdade de condições e de provas. Não há senão o retorno à vida que possa remediar os acidentes inevitáveis numa natureza perturbada por nossa ignorância nativa e o mau uso que nós fazemos de nossa liberdade. Se as crianças nascidas mortas não conseguem entrar na vida, elas aí retornarão por uma porta nova. E se nós procurarmos provas experimentais do renascimento, nós as acharemos mais facilmente entre os que morreram jovens e que se reencarnam imediatamente; eles parecem não ter atravessado as águas do Léthé, eles reencontrarão algumas lembranças de sua vida anterior.
Por outro lado, nenhuma concepção é mais incompreensível, nem mais burra do que aquela que supõe a aparição espontânea de uma alma sem antecedentes, flutuando entre o céu e o inferno e, no espaço de alguns anos, formando sua eternidade. Essa impiedade, que faz de Deus um criminoso carrasco, o obrigaria a criar almas em colaboração com os homens, e ele sancionaria assim a violação e o adultério, criando muito mais para o inferno do que para o céu.
Ao contrário, se nós considerarmos Deus como a fonte perpétua das almas que nascem livremente, compreenderemos a evolução sempre ascendente e, então, encontraremos uma justiça perfeita, porque a vida atual não é mais que uma conseqüência de nossas vidas anteriores, somos nós mesmos que, em nossa ignorância primeira, pecamos; não é mais o pai Adão, é toda a humanidade que passa por essa necessidade inelutável, não há outros progressos senão aqueles conquistados pelo esforço; e Deus nos deu, para isso, o tempo e a liberdade.
Ante essa luz, as objeções caem e as coisas se esclarecem. Descobre-se, no Evangelho, um sentido profundo para as palavras que passaram despercebidas.
Assim: “é que no fim do mundo que o joio será separado do trigo.” Mateus, cap. XIII, v. 39. Temos, então, até lá, como último recurso para progredir, as provas sucessivas que nos esperam e quando Jesus, dirigindo-se aos doutores da lei, lhes diz Cap. XXI, v. 31): “As mulheres de má vida vos precederão, no reino dos céus,” não é que Jesus promete o reino dos céus às mulheres de má vida, mas elas estão menos distantes que os doutores na letra das leis. Como toda criatura tem o meio de chegar ao fim ao qual ela está destinada, aquelas chegarão aí primeiro porque, no decurso das provas renovadas, elas se transformarão nas virgens puras, ou mães dignas de recompensas.
Eis o que é fácil de se compreender e o que nos ensina a filosofia racional do espiritismo. Os castigos e as recompensas são proporcionais às obras, e Deus não intervém como carrasco; é na liberdade que o homem se afasta ou se aproxima do objetivo, mas é preciso que ele nasça de novo se não tiver aproveitado suficientemente a vida presente. Nesse caso, ele será devolvido à terra ou vai germinar uma nova colheita.
Isto é grande, isto é justo, isto é belo; e é com prazer que constatamos que, desde Santo Agostinho, Gregório de Nysse…, etc., a Igreja jamais desaprovou este ideal. Bem ao contrário, os bispos aderiram a isto; poderíamos citar vários, citamos pelo menos as palavras do Sr. Passavali, vigário da Basílica de São Pedro de Roma:
“Parece-me que, se se pudesse propagar a idéia da pluralidade das existências para o homem, tanto neste mundo quanto em outros, como um meio admirável de realizar os desígnios misericordiosos de Deus, na expiação ou purificação do homem, com o objetivo de torná-lo digno dele e da vida imortal dos céus, já se teria dado um grande passo, pois isto seria suficiente para resolver os problemas mais emaranhados e os mais árduos que agitam atualmente as inteligências humanas. Quanto mais eu penso nesta verdade, mais ela me parece grande e fecunda com conseqüências práticas para a religião e para a sociedade.” Luiz, arcebispo.
É, com efeito, a solução única, toda outra conduz ao ateísmo ou à impiedade. Nenhuma instituição podendo viver na imobilidade, nós esperamos que a Igreja se decida a dar este grande passo, ela dará assim um sinal de vida esperada com ansiedade.
Se nós ficarmos, agora, do lado das provas experimentais, encontraremos fatos que confirmam bastante seriamente a hipótese das vidas sucessivas.
“Os vivos, dizia Sócrates, não nascem senão dos mortos.”
Os recém-nascidos, com efeito, são os mortos que, após ter deixado sua antiga veste, reaparecem em uma nova substância; e, se o esquecimento das vidas anteriores é a regra geral há, entretanto, exceções para os que reencarnam antes de ter sofrido, no além, as transformações que causam a perda da memória.
O esquecimento do passado jamais é absoluto, nada se perde, a encarnação não faz senão obnublar uma certa parte de nossas lembranças, a melhor lucidez dos sujeitos hipnóticos vem de que eles podem restabelecer as vias de comunicações de regiões ignoradas. Neste estado eles reencontram os traços parciais de sua vida passada. Essas experiências nem sempre são comprobatórias, mas sempre tendem a confirmar a hipótese.
A verdadeira prova se encontra nos casos excepcionais, onde as crianças não têm senão uma curta permanência na terra e onde elas recomeçam uma experiência em que falharam. Nessas condições excepcionais elas retornam do além com certas lembranças, o que lhe permite relembrar fatos que constituem uma prova muito nítida de sua identidade.
Os grandes jornais que, entretanto, agem com tanta maldade ao mencionar as experiências espíritas quando elas são conduzidas pelos sábios, citam-nos, no entanto, nos seus fatos diversos quando eles chegam a emocionar a opinião pública.
O Jornal contou em 1907 que a população inglesa de Rangoon foi posta em agitação pela reencarnação de uma criança que contava ter sido o major Welsh, morto em 1903, e essa criança com idade de três anos, descrevia com detalhes a habitação do oficial defunto, assim como as circunstâncias de sua morte.
Um pouco mais tarde, jornais ingleses, indianos e italianos apresentavam um caso semelhante; o de uma criança de quatro anos que dizia ter sido um inspetor de polícia, de nome Fucker, que tinha sido assassinado com um tiro de fuzil, a queima roupa, enquanto ele perseguia os bandidos. A criança contava outros episódios da vida desse inspetor, e uma multidão de curiosos vinha escutar o seu relato.
Esses fatos provam, pelo menos, o pouco valor dessa afirmação, freqüentemente repetida, que os fatos de reencarnação jamais apareciam entre a raça anglo-saxônica. É possível que a mentalidade inglesa não aceite facilmente essa hipótese, mas, na fenomenologia, a reencarnação reaparece sempre. Blake, um grande artista e vidente, não somente era reencarnacionista, mas afirmava ter sido ele mesmo alguma coisa como um discípulo de Sócrates. Um autor inglês bem conhecido, Florence Marryat, era um reencarnacionista convicto; Katie King falou de suas existências anteriores e Stainton Moses, um homem de alta cultura e de uma moralidade exemplar, investigador do movimento espiritualista na Inglaterra, fala em seus Ensinamentos Espiritualistas da necessidade de uma nova vida terrestre, para numerosos espíritos. Como se vê, a objeção de nossos adversários não tem grande valor.
Aliás, temos provas bem notáveis que seriam impossíveis de se explicar de outra forma senão pelo fato de um recomeço de existência.
Assim o caso do Sr. Isaac Foster, morador à…, conde de Effingam.
Tendo perdido uma filha pequena, ele foi se fixar em Dakota, onde teve uma nova filha que ele chamou de Nellie, mas que recusou obstinadamente levar esse nome, afirmando que se chamava Maria, nome que tinha a primeira criança. O Sr. Foster não tinha jamais recolocado os pés em sua antiga residência, quando aí retornou, conduzindo com ele Nellie, então com nove anos de idade. Lá, ela reconheceu sua morada e mesmo pessoas que jamais tinha visto. Mas o que houve de mais extraordinário é que ela pedia para rever a escola que se achava a uma milha de lá e, como ela fez uma exata descrição da casa da escola que Maria frequentara, seu pai aí a conduziu. Ela se dirigiu imediatamente para a sala que tinha ocupado dizendo: Eis aqui a minha.
Fatos similares são produzidos várias vezes e eu posso ainda citar dois que são mais perto de nós.
O primeiro, comunicado à revista de Roma Ultra, pelo capitão F. Battista, é o caso de uma menina que tinha se perdido e que apareceu à sua mãe toda feliz e, bem esperta, anunciou: Mamãe, eu voltei!
“Nessa época, escreveu o capitão, eu teria tratado como louco aquele que me tivesse falado de reencarnação. Seis meses mais tarde, minha mulher dava à luz uma filhinha que se parecia em todos os pontos com aquela que estava morta.” Eu passo sobre notáveis semelhanças porque poderiam atribuí-las ao parentesco de origem, mas eu chego ao fato.
A pequena tendo chegado à idade de seis anos, os pais, italianos todos os, dois, ouviram alguém cantar em francês no quarto de sua filhinha.
Inicialmente, eles não compreendiam, mas tendo se reequilibrado da emoção, eles entraram no quarto. Lá, sentada sobre sua cama, a criança cantava com um sotaque francês muito pronunciado uma espécie de cantilena que ninguém havia aprendido. Era uma canção de ninar que uma criada doméstica francesa embalava a outra nove anos antes. Quando da morte da criança que tinha se perdido, essa doméstica retornou ao seu país e, para não reaviver a lembrança desse luto penoso, o canto em questão tinha sido rigorosamente proscrito. Desde então, ele tinha saído completamente da memória dos pais.
A criança, interrogada para saber quem lhe havia ensinado esse canção respondeu: “Eu não a aprendi, eu a conheço todinha.”
“O leitor acredite o que quiser, acrescentou o capitão Battista; para mim, a conclusão está clara: os mortos voltam.”
O segundo caso é ainda mais notável porque aconteceu a um médico, que fez uma observação séria. O assunto aqui resumido conforme os Anais de Ciências psíquicas, nos anos de 1911 e 1912:
Em 1910, o Dr. Samona tinha perdido uma filhinha chamada Alexandrina. Três dias após ela se manifestava a sua mãe: “Mamãe, não chore, eu não te deixei…, agora eu vou me tornar pequena como isto.” E, dizendo isto ela lhe mostrava um pequeno embrião completo, acrescentando: “Tu deverás começar no presente a sofrer uma outra vez por mim.” Esse sonho se repetiu três dias após, mas a pobre mãe não acreditava de modo nenhum pois, em seguida a um aborto seguido de operação, ela se acreditava segura de não mais ficar grávida. Um dia em que ela se lamentava amargamente, três batidas secas e fortes, ouvidas por todos, ressoaram contra a porta e, mesmo à tarde, ocorreu a tiptologia.
Desde essa primeira experiência, a pequena se apresentou com um familiar que se supunha seu guia e chefe: “Minha mãezinha, não chores mais, pois eu começarei logo em seguida a renascer através de ti e, antes do Natal eu estarei convosco…, papai querido, eu voltarei, irmãozinhos eu voltarei…” E assim, em seguida, para cada um de seus familiares. Desde o início ela indicou que suas comunicações não durariam mais de três meses, pois seria ligada à matéria e cairia em sono. Enfim, na última sessão a pequena declarou: “Mamãe, existe uma outra.” Como não se compreendia, o guia interviu: “A criança não se engana, mas ela não sabe bem se exprimir; um outro ser se acha em torno de ti, que quer também retornar à terra.”
Isso não faz senão aumentar a incerteza. A mãe não acreditava poder ficar grávida, ela temia um novo aborto, grandes probabilidades contrárias faziam temer a desilusão.
A mãe, sempre às lágrimas, recebeu um novo aviso: “Aguarde, mamãe, se continuares a ser tão triste, acabarás por nos dar uma constituição pouco sólida.”
No mês de agosto, que era o quinto da gravidez, o Dr. Vincent Cordaro visitou Mme. Samona e declarou espontaneamente que suspeitava a presença de dois. No sétimo mês, sobreveio uma notícia que fez temer um parto prematuro. Passado o perigo, um especialista, o professor Giglio, diagnosticou por sua vez dois gêmeos, o sexo ficando duvidoso, mas em 22 de novembro nasceram as duas meninas.
Agora, a realidade de uma reencarnação se acha confirmada pelo Dr. Samona que, por várias vezes publicou suas observações. As duas gêmeas não se pareciam uma com a outra, mas a segunda Alexandrina se parecia espantosamente com a primeira; quanto às características da mentalidade e dos sentimentos elas são idênticas, e essas semelhanças se acham também na manutenção de outras particularidades notáveis.
Por exemplo, na vila isolada e silenciosa onde habita a família, se um carro pesado começa a fazer tremer o solo, Alexandrina se esconde nos joelhos de sua mãe, como fazia a primeira; como a outra ela fala de si mesma na terceira pessoa: “Alexandrina está apavorada.” Ela tem o mesmo terror do barbeiro quando ela o avista…, etc. Sua irmãzinha não partilha de seus terrores.
Outras observações tornam a semelhança tão completa que o relato do Dr. Samona termina por esta comparação: “O desenrolar da vida da atual Alexandrina, pelo que mostra a imagem, os hábitos e as tendências, é como se desenrolava de novo, antes de nós, o filme cinematográfico tendo já funcionado com a vida da outra.”
Como se vê, os fatos observados são bastantes significativos para nos permitir trabalhar com esta hipótese, a única razão, a de uma individualização lenta, encarnando-se e desencarnando-se nas formas que se adaptam cada vez melhor às necessidades do ser.
Não há senão uma criação digna de Deus, é o resultado de uma ação permanente, eterna, criando as possibilidades inesgotáveis que permitem a todo ser se constituir e evoluir em sua liberdade.
Nesta concepção, o controle experimental vem ainda em socorro de nossa hipótese. A existência de um corpo invisível, o Perispírito, nos ajuda a compreender o processo dos nascimentos, pois parece como um campo de força exteriorizável, capaz de agir sobre a matéria para reconstituir os órgãos.
Enfim, a contra-prova experimental nos é fornecida pelo fenômeno de materialização que se pode analisar, pois cria sob os nossos olhos, esta substância viva que passa do invisível ao visível e que se manifesta em graus variados de densidade.
A alma não estando jamais nua, tendo sempre a seu serviço as modalidades novas do corpo invisível, compreende-se que ela possa se desligar do corpo, estagnar no invisível e fazer apelo aos elementos novos para reencarnar.
Mas, a materialização espírita ou experimental, não sendo senão uma ação momentânea, não pode produzir senão uma coesão efêmera. É preciso, para reencarnar, que a força psíquica do ser forme o campo magnético em torno dos órgãos da mãe para construir segundo as vias normais, que são as da germinação, um organismo capaz de viver por si mesmo a vida psíquica.
A materialização verdadeira exige, entretanto, o concurso dos invisíveis. Estamos longe dos fatos e não bastante documentados para saber como Agnes, Thècle e Maria se materializam diante de São Martinho, mas encontramos mais perto de nós, na história dos santos, alguns casos de materialização indubitáveis. Por exemplo, aquele pelo qual Santa Catarina de Siena exteriorizava a imagem de um homem barbudo que seu confessor tomava pelo Cristo. Este fenômeno se explicaria muito bem pelo concurso das entidades do além, com as quais a santa vivia em comunicação espiritual, e que desejavam sem dúvida produzir um milagre edificante para a época, e no qual é fácil reconhecer o fenômeno que conhecemos hoje.
A materialização não implica de modo nenhum a presença real da pessoa que ela representa, todavia, esta manifestação é possível. O grande interesse que ela nos oferece é sobretudo no lado experimental que vem nos provar que as formas orgânicas são criações psíquicas, que a alma humana “participa da potência criativa do organizador do Universo, como o diz Gabriel Delanne; pois, que seja o espírito de um desencarnado ou o do médium exteriorizado, o fenômeno não é menos grandioso e parece demonstrar que realmente, em nós, existe uma parte infinitesimal da causa primeira, qualquer que ela seja, que engendrou as maravilhas do eterno Cosmos”.
A doutrina das vidas sucessivas é chamada a regenerar a humanidade, modificando as concepções obsoletas que não são mais aceitáveis. Ela traz aos enigmas da vida uma solução racional e satisfatória. Ela pertence à tradição, à revelação cristã, à filosofia e pertencerá logo à ciência. Saídas do limo da terra, ou nascidas na obscuridade, como diz São Paulo, nós marchamos todos em direção à luz. Tendo todos o mesmo caminho a percorrer, as mesmas provas a atravessar, encontraremos a igualdade em uma justiça perfeita.
Não há outros castigos senão os que infligimos a nós mesmos, e o caminho será mais longo para aquele que se extravia nas sendas da perdição. As dores e as negações de justiça das quais sofrem inocentes não são mais enigmas indecifráveis, são obras dos homens, Deus não é mais um carrasco.
E pois, se admitimos uma direção espiritual para reger o grande mistério da vida, podemos bem admitir que os guias de uma ordem mais elevada agem sobre nós como o magnetizador age sobre seu “sujet” pelas sugestões pré-natais. Assim, o anjo guardião, ao sugerir o esquecimento na nova vida, poderia nos impor certas provas ou certo ideal em relação com o passado que nós temos a corrigir ou a virtude que nós devemos adquirir. E nesta ordem de idéia seria uma lei muito sábia que nos impusesse o esquecimento, pois que é suficiente imaginar uma sociedade onde a lembrança subsistiria, para nisso compreender a impossibilidade. As reencarnações com a lembrança das faltas cometidas e das injustiças sofridas não fariam senão perpetuar os mal-entendidos, aumentar os ódios e os desejos de vingança. Haveria testemunhas que não perdoariam e haveria falsas testemunhas para vos acusar e vos convencer de ter sido, na encarnação última, um demônio.
Para viver de novo é preciso fazer pele nova, é o caso de dizê-lo e, sem o esquecimento, a vida do novo homem honesto não seria possível. Fim
(publicado originalmente no site: www.autoresespiritasclassicos.com)