A “Intuição” Era Eu
Luiz Sergio
Precisamos aprender a conduzir uma notícia ou uma pessoa de um lugar para outro, sem agir diretamente. – Luiz Sérgio
Volto hoje já bem mais refeito dos impactos da mudança de ambiente que sofri. Muitas explicações já tive e creio que entendi muita coisa, embora ainda me falte compreender muitíssimo mais. É coisa para “fundir a cuca” de qualquer criatura que se veja, de repente, numa situação assim, sem poder obter explicações rápidas. Todos demoram a mostrar-nos a real situação em que nos encontramos quando entrarmos nesta fase da vida, porque temem crises que dizem ser perigosas. Por isso, vão dando notícias bem devagar. Como sempre apressado (*), consegui mais do que, geralmente, conseguem os outros. Como resultado da minha curiosidade (**), puseram-me logo a trabalhar com um grupo de moços que são como os do “Projeto Rondon”.
(*), (**) Duas de suas características marcantes: a pressa e a curiosidade.
O estudo aqui é feito de forma bem objetiva. Os mestres, que nada têm de convencidos nem ares de superioridade, acompanham os alunos e dão lições de acordo com os problemas que aparecem. São, às vezes, lições longas que levam horas e horas e são dadas com a observação do fenômeno que se quer aprender.
Como desejei conhecer a “geografia” do mundo em que vivo, não sei por quê, me disseram que precisava primeiro aprender a “biologia” do Espírito. Eles dão outro nome: “psicobiofisiologia”. Isto porque acham que precisamos aprender primeiro o agente, para depois estudar o meio. Não sei se entendeu. Eu fiquei bem quieto, pois já percebi que é difícil fazer comparações entre o que aprendemos antes e o que vemos aqui. Muita coisa temos de “traduzir” para a linguagem que conhecemos e com frequência não conseguimos fazer associações.
Na primeira mensagem que lhe dei falei de água e do ar. Verdade é que eu tinha a impressão de que respirava mesmo, mas me disseram que é tão fluídico o ambiente em que vivo que a respiração é um simples costume que trazemos. É certo que quando entramos em um lugar onde há muita gente ruim, com maus pensamentos, falando coisas torpes ou praticando imoralidade psíquicas, ficamos ofegantes, parecendo que nos falta o ar. A água nós bebemos sim, mas a composição dela, segundo me ensinaram, é outra.
Aqui temos um conceito diferente das coisas. Nosso mentor (é assim que se chama o professor) ensinou-nos a não nos admirarmos com nenhum fato que presenciemos. Disse-nos que encarássemos tudo com naturalidade. Cada coisa a gente vê! Você nem imagina!
Que pena não ser possível voltar com consciência e explicar diretamente às pessoas os problemas tais quais são. Bem, é provável que quando nos vissem saíssem correndo de medo… Como gostaria de encontrar mamãe e papai, aí na Terra, e contar tudo, com a nossa linguagem corriqueira, explicando com gíria e tudo! Entretanto, faz parte de nosso aprendizado a maneira de expressar nossas ideias. É preciso que nós, ao escrevermos ou falarmos com os vivos, procuremos não causar qualquer confusão. Hoje, por exemplo, tomei assentamentos, resumindo o que devo dizer e como dizer. Só os apartes pessoais são espontâneos. Entretanto, as observações ingênuas, comparando o mundo de cá com o de lá, podem ser feitas, pois dão imagens conhecidas.
Ainda não visitei nenhum lugar que não tivesse relação com os vivos. Percorri muitas cidades junto com o mentor (professor) e outros colegas (irmãos). Estamos aprendendo a prestar os primeiros socorros e entrarmos na parte que diríamos social, isto é, mantendo contato com várias pessoas para que possam ser atendidas em suas necessidades.
Interessante é que precisamos aprender a conduzir uma notícia ou uma pessoa de um lugar para outro sem agir diretamente. Eu não posso segurar um homem e levá-lo para o lugar onde deve ir. Tenho de pensar perto dele, fazendo com que tenha, por si só, a lembrança de fazer o que precisa. Por exemplo (e isso aconteceu mesmo): Um menino estava desmaiado e ferido no meio do mato. A mãe e o pai procuravam, mas não imaginavam onde ele estivesse. Por acaso, estávamos passando pelo local e notamos o problema. O mentor olhou para todos nós e me escolheu para fazer a experiência. Ele já havia explicado e feito isso diante de nós todos. Achei-me com grande responsabilidade, mas queria acertar. Então, dirige-me para junto do pai do menino, que estava mais calmo, e fui pensando: “vá por aquele caminho”. O homem hesitava, porque supunha que o filho tivesse ido brincar onde costumava. Insisti com bastante força no mesmo pensamento que o homem, sem saber por que, tomou o rumo que eu desejava. Assim o fui guiando. Houve um momento em que ele quase desistiu. Fiquei seriamente apreensivo, porque, aí, eu teria de admitir a minha inexperiência. Redobrei minha força mental e ordenei: “vá por aqui, que seu filho está diante”. Mais tarde, depois de ter sido encontrado o menino, eu ouvi o pai contar que ia voltar do caminho, quando teve uma forte “intuição”. A intuição era eu.
Não vou negar que acho muita coisa engraçada e me divirto, porém, o mentor avisa que não podemos caçoar de nada nem de ninguém.
Estou sabendo que meus pais publicaram a outra mensagem que enviei. Agradeço, porque muito que todos os amigos tomassem conhecimento da realidade em que me encontro agora. Pelo menos alguma coisa está sendo feita nesse sentido. Consta que muitos Espíritos escrevem para seus amigos e para a sua família, mas, em geral, ninguém acredita neles. Deve ser bem aborrecido a gente fazer um brutal esforço para se comunicar com os vivos e eles nos tacharem de mortos, dizendo que isso não é possível ou que é ilusão. Ao menos eu não tive essa decepção.
Conto com sua capacidade de me entender para continuar escrevendo. Sei que não trouxe grandes novidades, mas o aprendizado é muito lento, dada a forma pela qual é feito. Além disso, muita coisa, deve ser omitida.
Creio que notou que estou sério. O que tenho visto me fez pensar muito. As lições que recebemos não permitem brincadeiras, pois os assuntos, além de interessantes, são de grande responsabilidade mesmo. Como são diferentes nossas aulas das que tínhamos vivos!
Ah! sim, você sabe que emprego mal a palavra “vivo”. Devemos dizer “encarnados” (com carne). Porém eu sinto uma espécie de alegria e digo ironicamente “quando estava vivo”, porque continuo vivo, contrariando muito materialista por aí. Aliás, o materialista poderia continuar a sê-lo mesmo depois de morto, já que ainda assim não se encontra nenhum Deus. Continuamos a encontrar as “manifestações” de Deus. É assim que aprendemos. O Universo todo é manifestação de Deus, que, para mim, continua sendo uma incógnita.
Suponho que já tenha escrito muito. Diga a mamãe (Zildinha), (Era assim que ele tratava sua mãe.), que não repare o filho dela estar criando juízo. Logo ela vai receber a carta séria, cheia de palavras difíceis e termos incompreensíveis, para fazer com que haja discussões e consultas, exames e análises, a fim de comprovar-se a veracidade das informações e ter-se a certeza da origem delas. Estou brincando. Mas; é “batata”. O meio em que se vive age sobre o nosso ânimo e acabamos sofrendo-lhe a influência.
Quero que papai saiba que sou tido como aluno com bom aproveitamento. Nunca imaginei que fosse ter tendência para “ciências ocultas”.
Creio que terminei. Deixo aqui, para ser lido, o meu abraço a todos, embora quisesse mandar um chute para o Cezinha (***) e coisas assim. Dizem-me que é incorreto; então, eu não mando. Retiro-me e continuo observando.
(***) Cezinha – tratamento familiar de Júlio Cezar, irmão de Luiz Sérgio.
Luiz Sérgio de Carvalho por Alayde de Assunção e Silva do livro: O Mundo que encontrei – Mensagem de 8/11/1973