Perdão e Esquecimento

Freddy Brandi

Perdoar é esquecer?

R: Não. Perdoar é independe de esquecer. Uma coisa nada tem a ver com a outra, são coisas distintas – até porque não somos alienados. Temos no cérebro uma memória que registra todos os fatos, por isto quem perdoa não tem que, necessariamente, esquecer do agravo sofrido. O que é preciso, na verdade, é esquecer no sentido de diluir a mágoa, a raiva ou o ressentimento que o fato gerou, caso contrário o perdão é superficial ou até mesmo ilusório.

Esse tipo de esquecimento é extremamente benéfico para quem sofreu algum tipo de agressão, porque a energia gerada, a cada instante em que se revive o fato infeliz, aumenta a ferida que se formou e numa verdadeira roda viva acumula novo e desnecessário sofrimento. Tanto isto é uma verdade que a própria ciência da psicologia diz a todo instante, atestando que o esquecimento da mágoa por si só vale como uma excelente psicoterapia, pois que… O apego à ofensa propicia ao ofendido a oportunidade de carregar sozinho a chaga em que ela se constitui.

A diferença está naquele que realmente perdoa e consegue liberta-se daquela parte pesada da lembrança a ponto de não mais sofrer ao relembrá-la.”

Perdoar é bom para quem perdoa.”, ou seja, quem perdoa livra-se do fardo triste que carregava e quem foi perdoado nem sempre alcança a mesma graça de vez que assumiu um ônus pelo qual responderá, ainda que perdoado.

A vinda de Jesus trouxe ao nosso Planeta uma nova concepção no que se refere ao perdão. Uma das partes mais lindas de sua missão foi justamente mudar a concepção de um Deus tão bárbaro quanto o homem, ensinando sobre um Deus justo… Mas infinitamente bom. Severo… mas infinitamente misericordioso. Um Deus que a tudo perdoa, mas que deixa ao sabor do livre arbítrio de cada um a responsabilidade de suas atitudes e o aprendizado que elas possam trazer. Lembramos que Jesus disse; perdoar não sete vezes mais setenta vezes sete vezes, isto é perdoar quantas vezes forem necessário. Além disso entre outras parábolas Jesus disse; amar o seu inimigo.

Emmanuel em “O Consolador”, questão 337: “Concilia-te depressa com o teu adversário” – essa é a palavra do Evangelho, mas se o adversário não estiver de acordo com o bom desejo de fraternidade, como efetuar semelhante conciliação?

– Cumpra cada qual o seu dever evangélico, buscando o adversário para a reconciliação precisa, olvidando a ofensa recebida. Perseverando a atitude rancorosa daquele, seja a questão esquecida pela fraternidade sincera, porque o propósito de represália, em si mesmo, já constitui uma chaga viva para quantos o conservam no coração. “·Vemos aí, embutida nas palavras de Emmanuel mais um alerta a considerar; aquele que busca sinceramente o perdão já está fazendo dignamente a sua parte, ainda que o ofendido se recuse. Quando aquele que concede o perdão não deve se ater ferrenhamente ao que vai ser feito do perdão que concedeu, pois fez a sua parte, também aí, o que se seguir é problema do perdoado”.

Para concluir lembramo-nos de que… esquecendo ou não, se o perdão é algo muito importante para o perdoado, é ainda muito mais para aquele que tem a felicidade de conseguir perdoar, porque…Quem perdoa já cresceu no amor… Quem humilde e sinceramente pede perdão… Caminha para o mesmo crescimento.

O perdão

Todos nós, cristãos, sabemos que devemos perdoar sempre que formos magoados, feridos, ofendidos, sob quaisquer circunstâncias.

Por quê então, é tão difícil perdoar?

É difícil sim, porque somos seres ainda muito imperfeitos, com muito orgulho e egoísmo, que nos dificultam o relacionamento entre as pessoas.

Temos grande dificuldade em colocarmo-nos no lugar do outro, procurando perceber os sentimentos e emoções que o levam à ofensa. Muitas pessoas nem se conscientizaram da importância e da necessidade dessa ação para o conhecimento de si mesmas e dos outros.

Temos dificuldades imensas em comunicarmo-nos, uns com os outros, de forma clara, expressando objetivamente nossos pensamentos e idéias.

Quantas vezes ofendemos e somos ofendidos pela expressão das nossas frases, por não nos fazermos entendidos.

Não sabemos também e não nos esforçamos para interpretar, corretamente, o que o outro tenta nos dizer.

Como trazemos ainda, o mal dentro de nós, percebemos nos outros, com muito mais facilidade, os defeitos, o que nos impede de compreendê-los. Habituamo-nos a julgá-los, preconceituosamente, com exigências que não temos para conosco.

Vivemos durante inúmeras reencarnações considerando o perdão, a indulgência, a bondade como expressões de fraqueza, de covardia.

Entendíamos um dever vingarmo-nos sempre que nos julgássemos ofendidos.

Hoje, que a luz dos ensinos de Jesus iluminaram nossos corações e nossas mentes; hoje que a lógica da doutrina espírita nos mostra os elementos justificativos da necessidade do perdão, queremos ser bons, perdoar, incondicionalmente, como exemplificou Jesus. Todavia, sentimos dificuldade de libertarmo-nos dos hábitos “de defesa da honra e da dignidade”, do “ter vergonha na cara”, “ter sangue nas veias”, do “não levar desaforo pra casa”, porque “difícil não é aprender coisas novas, difícil é desaprender hábitos antigos”.

Melindramo-nos, tão facilmente, por tão pequenas coisas, com as pessoas com as quais convivemos e até com as que amamos! … Por quê?

Penso por estarmos, no presente, tentando desenvolver em nós as virtudes exemplificadas por Jesus, esforçando-nos para vivenciar o bem, mas, ainda, muito distantes dessa conquista, irritamo-nos, facilmente, com aqueles que, voluntária ou involuntariamente, nos apontam nossos erros e enganos.

Gostaríamos que todos nos julgassem pelas nossas boas intenções e não pelas nossas atitudes e ações equivocadas. Porém, nós também, em relação aos outros, não nos esforçamos em compreender as suas dificuldades, os seus sentimentos e, queremos deles atitudes e ações que consideramos ideais, mas que ainda estão distantes de ser desenvolvidas por nós, em nós.

Por que devemos perdoar?

Por muitas razões. Devemos perdoar para facilitar a convivência, o relacionamento entre nós e os outros. Todos desejamos ser felizes, viver e trabalhar em ambientes agradáveis, harmoniosos que proporcionem prazer, satisfação, paz e o perdão recíproco, fraterno, de quem compreende que todos cometemos erros e, portanto, precisamos de indulgência, este perdão é o elemento capaz de transformar qualquer ambiente conturbado em ambiente prazeroso.

Devemos perdoar sempre que acontecerem grandes ou pequenas ofensas, porque o perdão desfaz as vibrações negativas advindas do ofensor e de que se sente ofendido, proporcionando a limpeza psíquica, levando à confiança recíproca que, por sua vez, liberta-nos do medo de mostramo-nos tal qual somos, com nossos defeitos e qualidades, de “soltarmo-nos” das amarras da insegurança, da amargura, do preconceito… E essa confiança recíproca, provocada pelo perdão, estimula-nos para a confiança no homem em geral, em nós próprios, em Deus e nas suas leis, abrindo-nos para o bem, para a alegria!

Vivemos em um mundo de ondas e vibrações que se cruzam, se atraem, se repelem conforme suas semelhanças e diferenças. Todo sentimento negativo, da tristeza ao ódio, pelas vibrações tensas e opressas que emitem, atraem outras semelhantes, de encarnados e desencarnados.

Em nosso próprio benefício, pois, precisamos cultivar sentimentos nobres para, ao irradiá-los, atrairmos as irradiações boas. A mágoa, o rancor, a raiva, o desejo de vingança, que nos impedem de perdoar, nos priva também de atrair energias boas e agradáveis.

Quando alguém nos magoa, nos agride, nos fere, o perdão é a nossa proteção contra o assédio das energias negativas.

Se estivermos atentos ao que sentimos quando não aceitamos a agressão alheia, procurando desculpar, na compreensão do momento infeliz do outro, comparando com o que sentimos quando deixamos penetrar em nós essas energias negativas que se casam com as nossas, teremos a comprovação dos efeitos sublimes e balsamizantes do perdão.

Devemos perdoar sempre porque o perdão, mesmo quando unilateral, desfaz o sentimento de animosidade. E no decorrer do tempo, na convivência nesta existência ou em futuras, através dos laços que se entrelaçam, o perdão terá sido a chave que abriu a porta do coração à amizade, ao relacionamento afetuoso, transformando adversários em amigos.

Quem necessita de perdão?

Todos nós, Espíritos eternos, imperfeitos ainda como demonstram a complexidade de sentimentos e emoções contraditórios que se agitam dentro de nós, levando-nos a erros e enganos.

Precisamos conseguir a consciência da necessidade do amparo mútuo e o perdão no dia-a-dia oferece ao que perdoa e ao perdoado a oportunidade de refletir sobre quem é, porque está aqui e para onde vai. O perdão no dia-a-dia leva-nos à humildade de reconhecermo-nos todos iguais, na origem e na destinação, nas possibilidades do desenvolvimento do nosso potencial, com as mesmas dificuldades de aprendizado.

Por quê então, sermos duros, exigentes, rigorosos com os outros e indulgentes conosco?

Como aprender a perdoar?

Perdoar é desculpar, não valorizando a ofensa, minimizando-a; é esquecer o mal recebido; é não sentir no ofensor um inimigo, mas uma pessoa com dificuldades pessoais.

Mas acima de tudo, em um grau elevado de evolução, perdoar é não se sentir ofendido, magoado, ferido pelo outro. Esse ideal a ser perseguido é não necessitar de perdoar porque vê no ofensor um irmão necessitado de ajuda, de compreensão, de amor. Nessa vivência, o exemplo maior é o de Jesus: “Perdoai-lhes Pai, porque não sabem o que fazem”. Veja este grande exemplo de fraternidade, humildade, amor ao próximo, amor aos seus algozes, Jesus mesmo sendo humilhado, mesmo sendo perseguido, mesmo acusado, mesmo julgado, condenado, sem direito á um julgamento justo, nos seus últimos momentos, perdoou incondicionalmente a todos sem distinção.

Até conseguirmos alcançar esse ideal é preciso ter essa meta como ponto de chegada, como fim a ser atingido. Um dia, não importa o tempo que levar – aliás, tempo é o que não nos falta: temos a eternidade – conseguimos. Como toda chegada tem seu ponto de partida, precisamos iniciar já, agora, o fortalecimento de nossa vontade no esforço de perdoar seja quem for, em qualquer situação ou circunstância.

Estimulado pela vontade de desenvolver, em nós, a virtude do perdão, devemos nos propor, perseverantemente, o exercício do perdão, sempre que surgir a oportunidade, sem alarde, no íntimo de nós próprios, da maneira que pudermos, em situação simples ou complexa, porque somente no exercício constante no dia-a-dia, a própria ação de perdoar se constitui no reforço da vontade de perdoar.

É uma luta interna, invisível aos olhos alheios, por vezes muito difíceis e tanto mais difícil se torna para a pessoa dominada pelo orgulho e egoísmo.

Aquele porém, que compreende e aceita que somos todos iguais na origem e no destino, como dissemos acima, que todos somos perfectíveis, que a vida não se limita a esta existência, tem os princípios básicos que justificam a necessidade e a capacidade de cada um de nós em perdoar sempre.

Busquemos perdoarmo-nos sempre para que a vida social, “a pedra de toque das boas ou más qualidades”, como escreveu Allan Kardec no livro “Céu e Inferno”, cap. III item 8, possa propiciar, em nós, o desenvolvimento das qualidades morais que Jesus nos ensinou e exemplificou.

Todos nós temos que aprender e cultivar o perdão. Perdoar é a compreensão do momento do outro, das suas deficiências, do distanciamento do seu espírito em relação ao centro de todo o Universo, da manifestação pura que brota silenciosamente em seu ser.

Não há porque temer, muito menos questionar nossas atitudes quando perdoamos àqueles que nos ofendem. Simplesmente, devemos nos opor à discórdia com o que há de mais sublime em cada um de nós. Perdoar é sentir o amor invadir nosso interior, o amor que conduz à harmonia e à paz do Universo, que dá vida e grandeza.

Perdoar não é uma atitude humilhante, é o reconhecimento da própria Luz que está em nosso coração, é o desejo que o próximo reencontre sua verdadeira natureza.

Perdoar é amar a vida, amar a si mesmo, amar o próximo, pois nossa origem é simplesmente o amor.

São Paulo, maio de 2005

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