ESTÁ ORDENADO QUE O HOMEM MORRA E RENASÇA VÁRIAS VEZES (Jorge Hessen)
No diálogo com o doutor Nicodemos, o Mestre de Nazaré foi muito objetivo quando disse: “Necessário vos é nascer de novo”. (1) Não obstante a lógica da reencarnação, ainda hoje, pastores e “bispos” evangélicos (ou protestantes), o clero católico, os reverendos anglicanos, líderes da igreja ortodoxa, teólogos “independentes” e outros teólogos recusam a Pluralidade das existências, fundamentados principalmente no “versículo 27 inserto no capítulo 9, constante na intrigante epístola conferida a Paulo, dirigida aos hebreus que narra: “aos homens está ordenado morrerem uma só vez, vindo, depois disto, o juízo”. (2) Pronto!… Caso encerrado. Está definitivamente decretada a “morte” da reencarnação entre os homens.
A propósito do célebre versículo 27 é óbvio que o homem carnal morre só uma vez. Quem é enterrado (ou cremado), jamais se levantará, parafraseando a narrativa de “Jó” (3) contida no capítulo7, versículo 9. Mas espiritualmente somos indestrutíveis, portanto imortais. Somos espíritos e renascemos para dar vida ao corpo perecível. E precisamos ponderar que Jesus em nenhum momento atribui para a vida física um valor decisivo para toda existência posterior à desencarnação.
Ao analisar com mais atenção a carta aos hebreus, perceberemos que não é Paulo de Tarso o seu autor. Desvia-se do estilo do Apóstolo dos Gentios. Falta-lhe o habitual cabeçalho localizável nas 13 cartas paulinas e ademais somente no último capítulo contém assunto à guisa de epístola. Orígenes, o maior escritor sobre as escrituras “sagradas”, da Idade Antiga, depois de expor os vários elementos e juízos sobre a questão da autoria da carta aos hebreus, concluiu: “para expressar o meu parecer, diria que os pensamentos são do Apóstolo [Paulo], mas… quem a redigiu só Deus o sabe”.
Diversos doutores da igreja, como Irineu de Lyon e Cipriano de Cartago, jamais aceitaram a carta aos hebreus. Tertuliano, Gregório de Elvira atribuíram-lhe autoria a “Barnabé”. Finalmente, Jerônimo, no Século V, escreve que “o costume dos latinos não admite a epístola aos hebreus entre as canônicas”. (4) Os teólogos e doutores da igreja só confirmaram tal carta aos hebreus a partir do Concílio de Trento, no Século XVI, portanto 1.600 anos após ter sido escrita.
Como se observa, até hoje o autor permanece desconhecido, mas e quanto aos destinatários? Sabe-se que tal missiva era destinada aos cristãos oriundos do judaísmo, pois é inteiramente impregnada de citações e alusões aos livros “sagrados” do Antigo Testamento. “A língua em que a epístola foi redigida afasta-nos da Judéia, na qual se falava o aramaico. Provavelmente a carta foi destinada a judeus-cristãos de Jerusalém refugiados na Fenícia, Chipre e Antioquia e noutras cidades helenísticas da costa mediterrânea.”. (5)
Os oponentes da reencarnação dogmatizaram a lição do “nascer de novo”, justificando a “ressurreição” da filha de Jairo (6),do filho da viúva de Naim (7) e do Lázaro (8). Porém, se tais personagens “ressuscitaram”, como sói afiançarem os dogmáticos, como ficaria a evocação do “encantado” versículo 27 da carta aos hebreus para negar a reencarnação”? Nesse caso, basta perceber que a filha de Jairo, o filho da viúva de Naim e Lázaro “ressuscitados” (segundo a visão da fé senil), não teriam morrido uma só vez, porquanto após a “ressurreição” todos três morreram novamente, ou será que permanecem vivos até hoje? Será que se encontram escondidinhos em Qumrãn, nas ruínas ao pé das montanhas do deserto da Judéia, às margens do Mar Morto, não muito além de Jericó? Huumm!!!
A bem da verdade, as personagens “ressuscitadas” por Jesus sequer estavam mortas, tão-somente estavam acometidas de catalepsia patológica (9). E mais: o Mestre asseverou que a verdade libertaria o homem, logicamente se a verdade (reencarnação) está sendo negada aos cristãos, fica evidente que os “sabe-tudo das escrituras sagradas” não se encontram livres, ou o que é pior, estão enceguecidos na mais absoluta estupidez. Portanto, são cegos que guiam outros cegos em direção ao despenhadeiro da ignorância.
Avaliemos as narrativas a seguir e cientificaremos que ao contrário do versículo 27 aos hebreus, está ordenado que o homem morra e renasça várias vezes. Notemos: “Após a transfiguração de Jesus, no Monte Tabor, os discípulos do Mestre o interrogam: Por que dizem os escribas ser preciso que antes volte Elias? – Jesus lhes respondeu: É Verdade que Elias há de vir e restabelecer todas as coisas: – mas, eu vos declaro que Elias já veio e eles não o conheceram e o trataram como lhes aprouve [João já havia sido decapitado]. É assim que farão sofrer o Filho do Homem. Então seus discípulos compreenderam que fora de João Batista que ele falara.”. (10) Aqui não há margens para inócuas digressões teológicas. Os discípulos compreenderam por si próprios que João Batista (filho de Isabel e primo de Jesus) era o profeta Elias reencarnado.
Ora, “a ideia de que João Batista era Elias e que os profetas podiam reviver na Terra se nos depara em muitas passagens dos Evangelhos. Se fosse errônea essa crença, Jesus não houvera deixado de a combater, como combateu tantas outras. Longe disso, ele a sanciona com toda a sua autoridade e a põe por princípio e como condição necessária, quando diz: “Ninguém pode ver o reino de Deus se não nascer de novo.” E insiste, acrescentando: Não te admires de que eu te haja dito ser preciso nasças de novo.”. (11)
O livro dos Reis anota: “Era um homem vestido de pelos, e com os lombos cingidos dum cinto de couro. Então disse ele: É Elias.”. (12) O profeta Malaquias narra: “Eis que eu vos enviarei o profeta Elias, antes que venha o grande e terrível dia do Senhor.”. (13) O evangelista Lucas que registra: “Apareceu-lhe, então, um anjo do Senhor, em pé à direita do altar do incenso. E Zacarias [progenitor de João Batista], vendo-o, ficou turbado, e o temor o assaltou. Mas o anjo lhe disse: Não temais, Zacarias; porque a tua oração foi ouvida, e Isabel, tua mulher, te dará à luz um filho, e lhe porás o nome de João; irá adiante dele no espírito e poder de Elias [reencarnado].”. (14)
O jovem evangelista Marcos assinala: “Então lhe perguntaram: Por que dizem os escribas que é necessário que Elias venha primeiro? Respondeu-lhes Jesus: Na verdade Elias havia de vir primeiro, a restaurar todas as coisas; e como é que está escrito acerca do Filho do homem que ele deva padecer muito a ser aviltado? Digo-vos, porém, que Elias já veio, e fizeram-lhe tudo quanto quiseram, como dele está escrito.” (15)
Mateus mais uma vez anota: “E desde os dias de João, o Batista, até agora, o reino dos céus é tomado a força, e os violentos o tomam de assalto. Pois todos os profetas e a lei profetizaram até João. E, se quereis dar crédito, é este (João Batista) o Elias que havia de vir [pela reencarnação]. Quem tem ouvidos, ouça.”. (16) “E Jesus falou aos seus discípulos, dizendo: Que dizem os homens que é o Filho do homem? E eles responderam: Uns dizem que é João Batista, outros que é Elias, outros ainda que é Jeremias ou algum dos profetas.”. (17)
Confirmação mais clara que as declarações de Jesus acima é impossível. O Mestre, na sua excelsitude, sabia da reencanação antecedente do filho de Zacarias e Isabel, e explicou que as pessoas fizeram o que quiseram com Elias [Joao Batista], mas que não o reconheceram, e também não poderiam, pois o profeta Elias estava reencarnado no corpo de João Batista. Enfim, não é tão difícil assim compreender a realidade da reencarnação; basta recorrer aos episódios sucedidos à época de Jesus, seja diante de Nicodemos, seja a confirmação do renascimento de Elias Joao Batista e até mesmo o evento do Cego de Nascença nas cercanias da piscina de Siloé.
Referências bibliográficas:
(1) João 3
(2) Hebreus 9
(3) Jó 7
(4) Soares, Matos. Tradução da Vulgata, publicada em São Paulo: Edições Paulinas, 1989
(5)Idem
(6) Mateus.9
(7) Lucas.7
(8) João.11
(9) No passado existiram casos de pessoas que foram enterradas vivas e na verdade estavam passando pela catalepsia patológica. Muitos especialistas, contudo, afirmam que isso não seria possível nos dias de hoje, pois já existem recursos tecnológicos que, quando corretamente utilizados, não falham ao definir os sinais vitais e permitem atestar o óbito com precisão.
(10) Kardec, Allan. Evangelho Segundo o Espiritismo, RJ: Ed FEB, 2001, Cap IV
(11) Idem
(12) 2 Reis 1
(13) Malaquias 4
(14) Lucas 1
(15) Marcos 9
(16) Mateus 11
(17) Mateus 15