A TRANSIÇÃO DO MUNDO E A TRANSIÇÃO DO EU
Também é assim no mundo da matéria. Quando estamos numa empresa, numa sala de aula ou mesmo num grupo de amigos, há períodos em que essas coletividades passam por transformações e, nem por isso, somos obrigados a nos transformar também. Empresas adquirem novas tecnologias, adotam novos paradigmas, modificam sua visão de mundo; uma sala de aula passa por provas e exames após os quais abrem-se a novas etapas, a estágios superiores de aprendizado; mesmo um grupo de amigos vive ciclos de casamento, de filhos, por exemplo, nos quais um solteirão isola-se e afasta-se.
Quantas vezes tivemos contato com a mensagem cristã nesses últimos dois mil anos? É verdade, é muito provável que já tivéssemos contato indireto com ela antes da encarnação do Cristo, pois os grandes mestres e profetas que o antecederam na Terra foram seus mensageiros, mas pensemos apenas na Vida depois da Vinda: por quantas encarnações tivemos contato com igrejas, organizações, almas de conduta exemplar e situações de vida que, vistas na perspectiva da eternidade, foram claras oportunidades para percebermos que o sentido da vida é desenvolvermos um Amor puro, sem apego e desinteressado por toda a Criação, atingindo o mais profundo das criaturas, lá onde reside o Criador? Nesse momento, não temos como saber quantas oportunidades já desperdiçamos.
Sabemos, no entanto, que ninguém vem à Terra à passeio, mas em missão ou resgate, e todos nós que tivermos clara consciência de não estarmos no estágio espiritual do Missionário, teremos que deduzir que viemos em resgate. A verdade, que surge assim límpida, é que somos alunos multirrepetentes de uma escola tão generosa que, mesmo depois de tantos fracassos motivados por nosso desprezo aos professores, por nossas fugas das aulas , por nossas reiteradas opções pela satisfação imediata e egoísta, ainda assim nos oferece mais uma chance.
Nesses nossos tempos, todos os membros de todas as religiões sabem da transição planetária. Todos aqueles que são desligados de quaisquer instituições religiosas também vem sendo, há muito, informados das mudanças geológicas, climáticas e magnéticas por que passa nosso planeta. Absolutamente todos nós fomos exaustivamente preparados antes dessa encarnação, e vimos sendo sistematicamente acompanhados em nossas crises e angústias de forma a nos tornarmos capazes, pelo menos nessa última tentativa, de aprender os rudimentos necessários ao novo estágio do planeta, expressos, tais aprendizados, com clareza plena nas bem-aventuranças do Sermão da Montanha, magnífico roteiro para nossa evolução.
Na primeira bem-aventurança (em Mateus, 5), Jesus deixou claro, como Sócrates já evidenciara, que sem a humildade inabilitamo-nos a qualquer processo educativo. De posse desse reconhecimento mínimo de nossa insuficiência, adquirimos condição de, atendendo à segunda bem-aventurança, não nos fixar nas dores da vida habilitando-nos a extrair delas as lições das quais são portadoras. A terceira bem-aventurança deixa claro que, entre as inúmeras conquistas às quais somos convidados por nossas dores, a fundamental para a entrada no mundo de regeneração é a auto-pacificação: “Bem-aventurados os mansos, porque eles herdarão a terra”, promete o Cristo. Inacreditavelmente, vivemos ainda entre multidões inconscientes que apenas travam a luta por sua própria vida, como os animais, ou pior, como se sua vida só fosse possível com a opressão dos seus semelhantes, como só os piores humanos são capazes.
Mesmo entre aqueles que acreditamos no grave momento de transição que atravessamos, alguns absurdamente se atêm aos fenômenos físicos, paralisando-se no debate sobre quais catástrofes enfrentaremos, que efeitos causarão, em quanto tempo e onde ocorrerão, repetindo equívocos – nossos equívocos! – , de, buscando nossos interesses políticos e econômicos não enxergarmos o Messias Espiritual, de, ansiando pela exaltação de nosso conhecimento e senso crítico, não ouvirmos o Mestre para muito além do produtor de milagres. Erros que, repetidos, nos trouxeram até aqui e que, agora, nos ameaçam incompatibilizar com a Terra.
Reverberando palidamente o chamamento em grandes brados que nos vem do Alto, concitemo-nos às lições de Humildade, ao Bem-sofrer (Evangelho Segundo o Espiritismo, Cap. V, 18) e à Auto-pacificação contidas em romances, leituras doutrinárias, filmes, observações da vida e, muito especialmente, nos desafios mais dolorosos que enfrentamos, pois que colocados pela Pedagogia Divina no momento e na intensidade exatos que nossas almas necessitam.